A vingança da porta
Era um hábito antigo que ele tinha:
Entrar dando com a porta nos batentes.
- Que te fez essa porta? a mulher vinha
E interrogava. Ele cerrando os dentes:
Nada! Traze o jantar! - Mas à noitinha
Calmava-se; feliz, os inocentes
Olhos revê da filha, a cabecinha
Lhe afaga, a rir, com as rudes mãos trementes.
Uma vez, ao tornar à casa, quando
Erguia a aldraba, o coração lhe fala:
Entra mais devagar.. - pára, hesitando...
Nisto nos gonzos range a velha porta,
Ri-se, escancara-se. E ele se vê na sala,
A mulher como doida e a filha morta.
(Alberto de Oliveira)
quinta-feira, 28 de junho de 2012
domingo, 27 de maio de 2012
A Linguagem
É língua muito transitiva a dos pássaros.
Não carece de conjunções nem de abotoaduras.
Se comunica por encantamentos.
E por não ser contaminada de contradições
A linguagem dos pássaros
Só produz gorjeios.
(Manoel de Barros)
Não carece de conjunções nem de abotoaduras.
Se comunica por encantamentos.
E por não ser contaminada de contradições
A linguagem dos pássaros
Só produz gorjeios.
(Manoel de Barros)
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Manoel de Barros
sábado, 12 de maio de 2012
Estou vazio como um poço seco
Estou vazio como um poço seco
Não tenho verdadeiramente realidade nenhuma
Tampa no esforço imaginativo!
(Álvaro de Campos)
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Fernando Pessoa; Imagem Munch
domingo, 22 de abril de 2012
Prestar atenção no que se diz e no que se ouve
Prestar atenção no que se diz é tão importante quando no que se ouve. Nossa sociedade tão tagarela quanto auditivamente desatenta nos ajuda a esquecer que somos seres falantes. Ou seja, que produzimos efeitos sobre o outro pelo simples fato de falarmos. Talvez a memória de que nosso amor e nosso ódio trafegam com as palavras que lançamos ao vento por aí possa melhorar o rumo de nossas vidas.
(Márcia Tiburi, In: http://filosofiacinza.wordpress.com/)
(Márcia Tiburi, In: http://filosofiacinza.wordpress.com/)
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Márcia Tiburi; Imagem Mark Rothko
segunda-feira, 26 de março de 2012
Labirinto

(Jorge Luis Borges)
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Imagem Salvador Dali,
Jorge Luís Borges
domingo, 18 de março de 2012
É preciso pensar...

Como subterfúgio
Num continuum
Evito dores das luzes
Ando pelos ares
Como os pássaros
Encondo asas
Para não as cortarem
Às vezes ando
Como semiviva
Por lembrar a vida à morte
E não quero pensar nisso
(Rosália Milsztajn)
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Rosália Milsztajn; Imagem Edvard Munch
domingo, 4 de março de 2012
Perder é uma arte...

Uma arte
A arte de perder não tarda aprender;
tantas coisas parecem feitas com o molde da perda
que o perdê-las não traz desastre.
Perca algo a cada dia.
Aceita o susto de perder chaves, e a hora passada embalde.
A arte de perder não tarda aprender.
Pratica perder mais rápido mil coisas mais:
lugares, nomes, onde pensaste de férias ir.
Nenhuma perda trará desastre.
Perdi o relógio de minha mãe.
A última, ou a penúltima, de minhas casas queridas foi-se.
Não tarda aprender, a arte de perder.
Perdi duas cidades, eram deliciosas.
E, pior, alguns reinos que tive, dois rios, um continente.
Sinto sua falta, nenhum desastre.
- Mesmo perder-te a ti (a voz que ria, um enteamado),
mentir não posso.
É evidente: a arte de perder muito não tarda aprender,
embora a perda - escreva tudo! - lembre desastre.
(Elizabeth Bishop)
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Elizabeth Bishop; Imagem Amanda Cass
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