sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Choveu toda noite ... cheiro de infância e uma saudade de outro janeiro ...


(...)
Ando muito completo de vazios.
Meu órgão de morrer me predomina.
Estou sem eternidades.
Não posso mais saber quando amanheço ontem.
Está rengo de mim o amanhecer.
Ouço o tamanho oblíquo de uma folha.
Atrás do ocaso fervem os insetos.
Enfiei o que pude dentro de um grilo o meu destino.
Essas coisas me mudam para cisco.
A minha independência tem algemas.
(...)
Manuel de Barros

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Fazendo um parêntese ... perguntas que não nos deixam calar


Em tempos de Fórum Social Mundial - 2009 ficam as perguntas:

Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilónia, tantas vezes destruida,
Quem outras tantas a reconstruiu?
Em que casas Da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha da China para onde
Foram os seus pedreiros? A grande Roma
Está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu?
Sobre quem Triunfaram os Césares?
A tão cantada Bizâncio
Só tinha palácios Para os seus habitantes?
Até a legendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou as Indias
Sózinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?
Em cada página uma vitòria.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?
Tantas histórias
Quantas perguntas
(Brecht)

A partir de hoje...

A partir de hoje pende-me ao pescoço

De um fio de cabelo o relógio das horas:

A partir de hoje cessa o curso dos astros,

E o sol,e o cantar do galo e as sombras;

E o que o tempo jamais me anunciou

É agora surdo e mudo e cego : -

Toda a Natureza agora se me cala

Ao tique-taque da lei e do relógio.


Nietzsche

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

A leveza e os mistérios do MAR...


O mar é só mar, desprovido de apegos,
matando-se e recuperando-se,
correndo como um touro azul por sua própria sombra,
e arremetendo com bravura contra ninguém,
e sendo depois a pura sombra de si mesmo,
por si mesmo vencido. É o seu grande exercício.
Não precisa do destino fixo da terra,
ele que, ao mesmo tempo,
é o dançarino e a sua dança.
Tem um reino de metamorfose, para experiência:
seu corpo é o seu próprio jogo,
e sua eternidade lúdica
não apenas gratuita: mas perfeita.
Baralha seus altos contrastes:
cavalo, épico, anêmona suave,
entrega-se todos, despreza ritmo
jardins, estrelas, caudas, antenas, olhos, mas é desfolhado,
cego, nu, dono apenas de si,
da sua terminante grandeza despojada.
Não se esquece que é água, ao desdobrar suas visões:
água de todas as possibilidades,mas sem fraqueza nenhuma.
E assim como água fala-me.
Atira-me búzios, como lembranças de sua voz,
e estrelas eriçadas, como convite ao meu destino.
Não me chama para que siga por cima dele,
nem por dentro de si:
mas para que me converta nele mesmo. É o seu máximo dom.
Não me quer arrastar como meus tios outrora,
nem lentamente conduzida.
como meus avós, de serenos olhos certeiros.
Aceita-me apenas convertida em sua natureza:
plástica, fluida, disponível,
igual a ele, em constante solilóquio,
sem exigências de princípio e fim,
desprendida de terra e céu.
E eu, que viera cautelosa,
por procurar gente passada,
suspeito que me enganei,
que há outras ordens, que não foram ouvidas;
que uma outra boca falava: não somente a de antigos mortos,
e o mar a que me mandam não é apenas este mar.
Não é apenas este mar que reboa nas minhas vidraças,
mas outro, que se parece com ele
como se parecem os vultos dos sonhos dormidos.
E entre água e estrela estudo a solidão.
E recordo minha herança de cordas e âncoras,
e encontro tudo sobre-humano.
E este mar visível levanta para mim
uma face espantosa.
E retrai-se, ao dizer-me o que preciso.
E é logo uma pequena concha fervilhante,
nódoa líquida e instável,
célula azul sumindo-se
no reino de um outro mar: ah!
do Mar Absoluto.

(Cecília Meireles)

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Não quero mais...


"Mania de esperar que as coisas sejam dum jeito determinado,
por isso a gente se decepciona e sofre."
(Caio Fernando de Abreu)

ILUSÕES? ... as vezes temos recaídas ...




"o tempo,
o tempo,
o tempo,
embora inconsumível
é o nosso melhor alimento."
(Raduan Nassar)

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Tudo é implícito


... Mas o meu principal está sempre escondido.
Sou implícita.
E quando vou me explicar perco a úmida intimidade.
Claice Lispector - Água Viva

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

... muda explosão interna

"(...) Sinta-se bem.
Eu na minha solidão quase vou explodir.
Morrer deve ser muda explosão interna.
O corpo não aguenta mais ser corpo.
E se morrer tiver o gosto de comida quando se está com muita fome?
E se morrer for um prazer, egoísta prazer?"

(Clarice Lispector - Água Viva)

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

As vezes somente sinto


"Meu mundo se resume a palavras que me perfuram,
a canções que me comovem,
a paixões que já nem lembro,
a perguntas sem respostas,
a respostas que não me servem,
à constante perseguição do que ainda não sei.
Meu mundo se resume ao encontro do que é terra e fogo dentro de mim,
onde não me enxergo,
mas me sinto."
(Martha Medeiros)

domingo, 18 de janeiro de 2009

Condição de um poema ... uma floresta noturna


Um poema
como um gole d'água bebido no escuro.
Como um pobre animal palpitando ferido.
Como pequenina moeda de prata perdida para sempre na floresta noturna.
Um poema
sem outra angústia que a sua misteriosa condição de poema.
Triste
Solitário
Único
Ferido de mortal beleza.

(Mário Quintana)

sábado, 17 de janeiro de 2009

Lembranças...



Saudade é quando a gente esconde uma lembrança dentro de uma música.

E a música dentro de uma lembrança.

(Fabrício Carpinejar)

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Atrás das Janelas

"Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então.
E quase paro de sentir fome."
Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Aprendizagem



Preciso aprender com a sábia natureza:

"um dia tudo se transforma,

como uma onda do mar

esta é a dialética da vida,

tempo de "nascer" e tempo de "morrer"

(projetos, histórias, matérias, sentimentos, vidas)"

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Fim de uma viagem ... começo de outra ...



O fim duma viagem é apenas o começo doutra.
É preciso ver o que não foi visto,
ver outra vez o que se viu já,
ver na Primavera o que se vira no Verão,
ver de dia o que se viu de noite,
com sol onde primeiramente caía chuva,
ver a seara verde,
o fruto maduro,
a pedra que mudou de lugar,
a sombra que aqui não estava.

(José Saramago)


segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

A difícil tarefa de existir!!!!

"Duas almas moram
no teu peito humano,
nas entranhas tuas.
Evita o insano
esforço da escolha:
precisa das duas.
Pra ser um, amigo,deves ter contigo
conflito incessante:
um lado elevado,
bonito, elegante;
o outro, enfezado
e sujo, aos molambos.
Precisas de ambos!"
[Brecht]

sábado, 10 de janeiro de 2009

Momento Presente

"Deixe que ele respire, como uma coisa viva. E tenha muito cuidado:
ele pode quebrar.
Como um bebê ou um cristal: tome-o nas mãos com muito cuidado.
Ele pode quebrar, o momento presente [...]"

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Um dia chuvoso...

... a respiração contínua do mundo
é aquilo que ouvimos
e chamamos de silêncio.
(Clarice Lispector)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Quinta-Feira: início do encontro com meus "fantasmas"

(...)
Quem me leva os meus fantasmas?
Quem me salva desta espada?
Quem me diz onde é a estrada?
(...)
Composição: (Pedro Abrunhosa)


Viver é etcetare



"A gaveta da alegria

já está cheia

de ficar vazia"

(Alice Ruiz)

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Imaterial peso da solidão

Minha alma tem o peso da luz.
Tem o peso da música.
Tem peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita.
Tem o peso de uma lembrança.
Tem o peso de uma saudade.
Tem o peso de um olhar.
Pesa como pesa uma ausência.
E a lágrima que não se chorou.
Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.
(Clarice Lispector)

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Segunda-Feira de 2009

O espaço devora azuis lembranças e afetos.
lá embaixo mãos se despedem palidamente...
(Mara Faturi)

domingo, 4 de janeiro de 2009

Encantamento


"Assim que anoiteceu, saiu para pescar.
Peixes não, estrelas.
Afastou-se da casa, atravessou um campo até o seu limite.
Na linha do horizonte, sentado à beira do céu, abriu a caixa de frases poéticas que havia trazido como iscas.
Escolheu a mais sonora, prendeu-a firmemente na rebarba luzidia.
Depois, pondo-se de cabeça para baixo, lançou a linha no imenso azul, deixando desenrolar todo o molinete.
E, paciente, enquanto a Lua avançava sem mover ondas, começou a longa espera de que uma estrela viesse morder o seu anzol."

MARINA COLASANTI in "Contos de Amor Rasgado"

sábado, 3 de janeiro de 2009

Planejar a vida

... a VIDA planeja melhor do que nós ...

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

E você, deletou o prazer da poesia?

Meus livros (que não sabem que eu existo)
São parte de mim como este rosto
De fontes grises e de grises olhos
Que inutilmente busco nos cristais
E que com a mão côncova percorro.
Não sem alguma lógica amargura
Penso que as palavras essenciais
Que me expressam se encontram nessas folhas
Melhor assim.
As vozes dos mortos
Vão me dizer para sempre.
(Jorge Luis Borges)
Recebi este questionário como uma "provocação".
Assim chegou a mensagem: "Responda e faça um balanço para este início de 2009. Observe se a academia e seus "ismos" não deletou de você o prazer de "Escrever, plantar, viajar, cantar, ser amável" (Bertolt Brecht).
1. Livro/Autor(a) que marcou sua infância.
2. Livro/Autor(a) que marcou sua adolescência.
3. Autor(a) que mais admira.
4. Livro/Autor(a) que esta lendo “hoje”.
5. Leu e não gostou.
6. Lê e relê.
7. Manias quando tem um livro nas mãos.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Construir novos dias!



- 50 Aniversário Revolução Cubana -

MAÑANA

Como forjamos al hierro forjaremos días nuevos.

Sudorosos y fuertes,
descenderemos a lo profundo
y arrancaremos a sus entrañas las nuevas conquistas.

Ascenderemos a las montañas,
y el sol nos llenará su vida:
seremos pedazos de sol!

Forjaremos otra vida grandiosa y humana;
la eternizaremos con un potente esfuerzo unánime.
Y bajo el ojo virgen de los amaneceres,
cantaremos a la fuerza creadora del músculo
y a la armonía fraterna de las almas.

Muchos,
y seremos solo uno.
Para el gran canto sólo tendremosuna voz.

Cantaremos al hierro,
a la belleza fuerte y nueva de la máquina.
Los yunques, los tractores
que violan a la tierra en cópula mecánica;
la turbina, el dinamo;
la fuga infinita de los rieles
- sistema venoso de acero por onde circula la vida.
Los canales de luz de los cables eléctricos
- células cerebrales del mundo,
donde vibra la fuerza.

Cantaremos al hierro, porque el mundo es de hierro,
y somos hijos del hierro.
Pero estaremos sobre la máquina.

Un sentimiento nuevo surgirá en nuestros pechos,
y será tan inmenso,
que para amarlo se hará la tierra un corazón.
¿Dónde estará entonces nuestra amargura?
¿Dónde estos días miserables y inválidos?...

Como forjamos el hierro forjamos otros siglos.
Enjoyados de júbilos,
los días nuevos nos verán,
musculosos y fuertes, desfilar frente al sol.

Vendremos de los campos, de las ciudades, de los talleres:
cada instrumento de trabajo será como un arma;
- una sierra, una llave, un martillo, una hoz -
y ocuparemos la tierra como un ejército en marcha,
saludando a la vida con nuestro canto unánime!
Regino Pedroso - Poeta Cubano