sexta-feira, 31 de julho de 2009

Algumas coisas





"E qualquer coisa que eu recorde agora, vai doer, a memória, é uma vasta ferida."

(Chico Buarque)

quinta-feira, 30 de julho de 2009

A volta


Volto em forma de puzzle

preciso sempre remontar meus pedaços...

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Luz



Portas, imensas e nocturnas portas,
quando o que desejamos é
um rasgão luminoso.
(Mário Rui de Oliveira)

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Quarta-Feira

“De sonhar ninguém se cansa,
porque sonhar é esquecer,
e esquecer não pesa
e é um sono sem sonhos
em que estamos despertos”

Fernando Pessoa

terça-feira, 21 de julho de 2009

... ver mais ainda...


"É talvez o último dia da minha vida.
Saudei o sol, levantando a mão direita,
Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus.
Fiz sinal de gostar de o ver ainda, mais nada."
(Fernando Pessoa)

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Sopra demais o vento...


Sopra o vento, sopra o vento,
Sopra alto o vento lá fora;
Mas também meu pensamento
Tem um vento que o devora.
Há uma íntima intenção
Que tumultua em meu ser
E faz do meu coração
O que um vento quer varrer;
Não sei se há ramos deitados
Abaixo no temporal,
Se pés do chão levantados
Num sopro onde tudo é igual.
Dos ramos que ali caíram
Sei só que há mágoas e dores
Destinadas a não ser
Mais que um desfolhar de flores.
(Fernando Pessoa)

Para os amigos - reais e verdadeiros


"Para mim, atualmente, companheirismo e lealdade são meio sinônimos de felicidade. Meus amigos são muito fortes e muito profundos, são amigos de fé, para quem eu posso telefonar às cinco da manhã e dizer: olha, estou querendo me matar, o que eu faço? Eles me dão liberdade para isso, não tenho relações rápidas, quer dizer, tenho porque todo mundo tem, mas procuro sempre aprofundar. E isso é felicidade, você poder contar com os outros, se sentir cuidado, protegido. Dei esse exemplo meio barra pesada de me matar....esquece, posso ligar para ver o nascer do sol na 'Praia de Boa Viagem' às cinco da manhã. Já fiz isso, inclusive."
(Caio Fernando de Abreu)

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Nuanças das cores




Esses que pensam que existem sinônimos, desconfio que não sabem distinguir as diferentes nuanças de uma cor.
(Mário Quintana)

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Condição humana


Como o meu próprio ruído, o de
ninguém,
escutando,
parte-se.

(Aram Saroyan)

quarta-feira, 15 de julho de 2009


"Palavras são meu jeito mais secreto de calar"

(Lya Luft)

segunda-feira, 13 de julho de 2009

As velhas crucificações ... assim vai sendo sublimada a vida


Da vez primeira em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha
Depois, de cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha
E hoje, dos meus cadáveres, eu sou
O mais desnudo,
o que não tem mais nada
Arde um toco de vela, amarela ...
(Mário Quintana)

domingo, 12 de julho de 2009

Todo Sentimento


Outrora eu era daqui,
e hoje regresso estrangeiro,
Forasteiro do que vejo e ouço,
velho de mim.
Já vi tudo, ainda o que nunca vi,
nem o que nunca verei.

sábado, 11 de julho de 2009

Palavras




"Não, nunca vai se acostumar. Mais fácil abrir a carne, pinçar um nervo, supurar a terrível das feridas. Mas com as palavras, com a dor abstrata contida nas palavras, com isto jamais se acostumará."

(Letícia Wierzchowski In: Os Aparados)

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Jardins & Aprendizados


A MORTE DOS GIRASSÓIS

Anoitecia, eu estava no jardim. Passou um vizinho e ficou me olhando,
pálido demais até para o anoitecer. Tanto que cheguei a me virar para
trás, quem sabe alguma coisa além de mim no jardim. Mas havia apenas os
brincos-de-princesa, a enredadeira subindo tenta pelos cordões, rosas cor-de-rosa, gladíolos desgrenhados.
Eu disse oi, ele ficou mais pálido.
Perguntei que-que foi, e ele enfim suspirou: "Me disseram no Bonfim que
você morreu na Quinta-feira."
Eu disse ou pensei em dizer ou de tal forma deveria ter dito que foi como se dissesse:
"É verdade, morri sim.I sso que você está vendo é uma aparição, voltei porque não consigo me libertar do jardim, vou ficar aqui vagando feito Egum até desabrochar aquela rosa amarela plantada no dia de Oxum. Quando passar por lá no Bonfim diz que sim, que morri mesmo, e já faz tempo, lá por agosto do ano passado. Aproveita e avisa o pessoal que é ótimo aqui do outro lado: enfim um lugar sem baixo-astral."
Acho que ele foi embora, ainda mais pálido. Ou eu fui, não importa.

Mudando de assunto sem mudar propriamente, tenho aprendido muito com o jardim. Os girassóis, por exemplo, que vistos assim de fora parecem flores simples, fáceis, até um pouco brutas. Pois não são. Girassol leva tempo se preparando, cresce devagar enfrentando mil inimigos, formigas vorazes, caracóis do mal, ventos destruidores. Depois de meses, um dia pá! Lá está o botãozinho todo catita, parece que já vai abrir.
Mas leva tempo, ele também, se produzindo. Eu cuidava, cuidava, e nada.Viajei por quase um mês no verão, quando voltei, a casa tinha sido pintada, muro inclusive, e vários girassóis estavam quebrados. Fiquei uma fera. Gritei com o pintor: "Mas o senhor não sabe que as plantas sentem dor que nem a gente?" O homem ficou me olhando tão pálido quanto aquele vizinho. Não, ele não sabe, entendi. E fui cuidar do que restava, que é sempre o que se deve fazer.
Porque tem outra coisa: girassol quando abre flor, geralmente despenca. O talo é frágil demais para a própria flor, compreende? Então, como senão suportasse a beleza que ele mesmo engendrou, cai por terra, exausto da própria criação esplêndida. Pois conheço poucas coisas mais esplêndidas, o adjetivo é esse, do que um girassol aberto.
Alguns amarrei com cordões em estacas, mas havia um tão quebrado que nem dei muita atenção, parecia não valer a pena. Só apoiei-o numa espada-de-são-jorge com jeito, e entreguei a Deus. Pois no dia seguinte, lá estava ele todo meio empinado de novo, tortíssimo, mas dispensando o apoio da espada. Foi crescendo assim precário, feinho, fragilíssimo. Quando parecia quase bom, cráu! Veio uma chuva medonha e deitou-se por terra. Pela manhã estava todo enlameado, mas firme. Aí me veio a idéia: cortei-o com cuidado e coloquei-o aos pés do Buda chinês de mãos quebradas que herdei de Vicente Pereira. Estava tão mal que o talo pendia cheio dos ângulos das fraturas, a flor ficava assim meio de cabeça baixa e de costas para o Buda. Não havia como endireitá-lo.
Na manhã seguinte, juro, ele havia feito um giro completo sobre opróprio eixo e estava com a corola toda aberta, iluminada, voltada exatamente para o sorriso do Bunda. Os dois pareciam sorrir um para ooutro. Um com o talo torto, outro com as mãos quebradas. Durou pouco, girassol dura pouco, uns três dias. Então peguei e joguei-o pétala por pétala, depois o talo e a corola entre as alamandas da sacada, para que caíssem no canteiro lá embaixo e voltassem a ser pó, húmus misturado à terra, depois não sei ao certo, voltasse à tona fazendo parte de uma rosa, palma-de-santa-rita, lírio ou azaléia, vai saber que tramas armam as raízes lá embaixo no escuro, em segredo.

Ah, pede-se não enviar flores. Pois como eu ia dizendo, depois que comecei a cuidar do jardim aprendi tanta coisa, uma delas é que não se deve decretar a morte de um girassol antes do tempo, compreendeu?Algumas pessoas acho que nunca. Mas não é para essas que escrevo.

(Caio Fernando de Abreu)

quinta-feira, 9 de julho de 2009

cinquenta e três minutos... já é sexta-feira

Eu - pensou o principezinho -
se tivesse cinquenta e três minutos para gastar,
iria caminhando passo a passo,
mãos no bolso,
na direção de uma fonte...

(Saint-Exupéry)

Servilidade altruísta

E eu que estou bêbado de toda a injustiça do mundo...
— O dilúvio de Deus e o bebe loirinho boiando morto à tona de água,
Eu, em cujo coração a angústia dos outros é raiva,
E a vasta humilhação de existir um amor taciturno
—Eu, o lírico que faz frases porque não pode fazer sorte,
Eu, o fantasma do meu desejo redentor, névoa fria
—Eu não sei se devo fazer poemas, escrever palavras, porque a alma
—A alma inúmera dos outros sofre sempre fora de mim..
Meus versos são a minha impotência.
O que não consigo, escrevo-o;
E os ritmos diversos que faço aliviam a minha cobardia...
A costureira estúpida violada por sedução,
O marçano rato preso sempre pelo rabo,
O comerciante próspero escravo da sua prosperidade
— Não distingo, não louvo, não (...)
—São todos bichos humanos, estupidamente sofrentes...
Ao sentir isto tudo, ao pensar isto tudo, ao raivar isto tudo,
Quebro o meu coração fatidicamente como um espelho,
E toda a injustiça do mundo é um mundo dentro de mim...
Meu coração esquife, meu coração (...),
meu coração cadafalso —
Todos os crimes se deram e se pagaram dentro de mim.
Lacrimejância inútil, pieguice humana dos nervos,
Bebedeira da servilidade altruísta,
Voz com papelotes chorando no deserto de um quarto andar esquerdo....

(Álvaro de Campos)

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Enxergar por inteiro

Não passam as dores, também não passam as alegrias. Tudo o que nos fez feliz ou infeliz serve pra montar o quebra-cabeça da nossa vida, um quebra-cabeça de cem mil peças. Não há nenhuma peça que não se encaixe. Todas são aproveitáveis. Como são muitas, você pode
esquecer de algumas, e a isso chamamos de "passou". Não passou. Está lá dentro, meio perdida, mas quando você menos esperar, ela será necessária para você completar o jogo e se enxergar por inteiro.
(Martha Medeiros)

terça-feira, 7 de julho de 2009

Sobre as molduras...


RETRATO PINTADO DO CASAL

Fabrício Carpinejar

Nas moradias do interior, havia sempre dois quadros. A Última Ceia na cozinha e o retrato ovalado do casal de patriarcas no alto da sala. Ambos habituais em residências respeitáveis, consensuais a exemplo da escada em igreja e dos morrinhos em praça.

Marido e mulher alçados à cúpula de madeira. Maquiados para a eternidade.

A imagem revelava algo de alucinação. De amor assombrado. De inscrição de lápide. Um retrato que dava a noção de que o homem e a mulher estavam mortos mesmo que andando animados pelos corredores. Colocar quadro de um casal vivo mexia a terra por debaixo das tábuas.

A casa se tornava um túmulo. A mesa mancaria os pratos. As portas rangeriam portões de ferro.
Emanava daquele canto uma sensação de irrealidade, de antiguidade precoce. Como a fotografia ficava ruim, um artista retocava os traços com tinta a óleo. Pregava sombra no olho, corava a face, cobria as vestes de tons marrons e azulados. Melhorava o rosto.

As figuras masculinas ressurgiam com vermelho forte na boca, tomadas de um batom amoroso e fúnebre.

A fotografia também pedia a mão da pintura. Era e não era aquilo. Duas traições, a do fotógrafo e do pintor, formavam uma esquisita fidelidade. A distorção traduzia a paranormalidade de um longo casamento.

Numa conversa de café, um amigo - irei chamá-lo de Luiz como meu pai - confessou a dificuldade de encontrar a mulher de sua vida. Quem sabe até encontrou, mas não é igual a merecê-la ou suportá-la. Ninguém tem mais paciência para tolerar um amor real. Prefere um amor dentro de sua realidade.

Eu perguntei qual o sinal da paixão incondicional: Comprar aliança? Casar? Viver junto? Ter filhos? Repartir as contas?

O quê, afinal? De que modo expressaria o fim da busca?

Ele me olhou usando seus pés. Tirou os óculos e envelheceu dez anos. Pedi para que colocasse os óculos para voltar à minha idade. Alinhou as lentes e respondeu: - Fazer um retrato pintado com ela.

Brinquei que parecia idéia ultrapassada. Para mostrar quem manda e impor autoridade aos parentes. Talvez porque seja mais fácil desobedecer a um rosto afetivo do que a um quadro.
E percebi que me enganei, o desejo foi descendo lentamente em meus ombros, como um casaco redescoberto. E me transmitiu uma tranqüilidade acalorada. Uma paz de copo de água na cabeceira, de terço no retrovisor, de chave no bolso.

Um retrato na parede pára o tempo dentro de casa. Assim como os familiares são lavados e vestidos para o enterro, aquilo era lavar e vestir o par em vida. E percebi que não prometemos com medo de não cumprir. Quando falamos que não cumpriremos já estamos fazendo outra promessa. A promessa da negação.

Não há saída: o ceticismo é uma fé ao contrário. Penso com calma e vejo que a moldura pode ser uma aliança.

segunda-feira, 6 de julho de 2009



"Talvez a morte tenha mais segredos para nos revelar que a vida"

(Gustave Flaubert)

domingo, 5 de julho de 2009

Se tê-las sabe a não as ter?



Onde pus a esperança, as rosas

Murcharam logo.

Na casa, onde fui habitar,

O jardim, que eu amei por ser

Ali o melhor lugar,

E por quem essa casa amei -

Deserto o achei,

E, quando o tive, sem razão para o ter

Onde pus a afeição, secou

A fonte logo.

Da floresta, que fui buscar

Por essa fonte ali tecer

Seu canto de rezar -

Quando na sombra penetrei,

Só o lugar achei

Da fonte seca, inútil de se ter.

Para quê, pois, afeição, esperança,

Se perco, logo

Que as uso, a causa para as usar,

Se tê-las sabe a não as ter?

Crer ou amar -

Até à raiz, do peito onde alberguei

Tais sonhos e os gozei,

O vento arranque e leve onde quiser

E eu os não possa achar!

sábado, 4 de julho de 2009

Ao Emissário do Rei


Emissário de um rei desconhecido,
Eu cumpro informes instruções de além,
E as bruscas frases que aos meus lábios vêm
Soam-me a um outro e anômalo sentido...

Inconscientemente me divido
Entre mim e a missão que o meu ser tem,
E a glória do meu Rei dá-me desdém
Por este humano povo entre quem lido...

Não sei se existe o Rei que me mandou.
Minha missão será eu a esquecer,
Meu orgulho o deserto em que em mim estou...

Mas há ! Eu sinto-me altas tradições
De antes de tempo e espaço e vida e ser...
Já viram Deus as minhas sensações...

(Fernando Pessoa)

sexta-feira, 3 de julho de 2009


Viver -
é um rasgar-se e remendar-se,
é um descuido prosseguido
(Guimarães Rosa , in Grandes Sertões: Veredas)

quinta-feira, 2 de julho de 2009

¿Adónde van?



¿Adónde van las nieblas, la borra del café, los almanaques de otro tiempo?
(Julio Cortázar)

quarta-feira, 1 de julho de 2009


Nada é,
tudo coexiste:
talvez assim seja certo..
(Fernando Pessoa)