quarta-feira, 25 de novembro de 2009



O mar jaz; gemem em segredo os ventos
Em Eolo cativos;
Só com as pontas do tridente as vastas
Águas franze Netuno;
E a praia é alva e cheia de pequenos
Brilhos sob o sol claro.
Inutilmente parecemos grandes.
Nada, no alheio mundo,
Nossa vista grandeza reconhece
Ou com razão nos serve.
Se aqui de um manso mar meu fundo indício
Três ondas o apagam,
Que me fará o mar que na atra praia
Ecoa de Saturno?

(Fernando Pessoa)

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Para o dia de hoje



Depois de estar cansado de procurar
Aprendi a encontrar.
Depois de um vento me ter feito frente
Navego com todos os ventos.

(Friedrich Nietzsche)

Tenho saudade
De pessoas que fui conhecendo
lembranças que fui esquecendo
amigos que acabei perdendo
Mas continuo vivendo e aprendendo.

(Martha Medeiros)

domingo, 22 de novembro de 2009



O meu coração quebrou-se
Como um bocado de vidro
Quis viver e enganou-se...

(Fernando Pessoa)
Estás só. Ninguém o sabe.
Estás só.
Ninguém o sabe.
Cala e finge.
Mas finge sem fingimento.
Nada esperes que em ti já não exista,
Cada um consigo é triste.
Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas,
Sorte se a sorte é dada.
(Fernando Pessoa)

sábado, 21 de novembro de 2009

Sempre um engano...

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

(Fernando Pessoa)

Não troco a cadeira de balanço pelo divã. Com o ritmo e o balanço, falarei bem mais do que deitado.
(...)
Cadeira de balanço é movimento enternecido, um pedalinho dos ventos.

(Fabrício Carpinejar)

PS: ando trocando a cadeira de balanço pela rede...
O balanço da rede, uma revoada de pássaros num dia de vento.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009



A vida é cheia de obrigações
que a gente cumpre
por mais vontade que se tenha
de as infringir
deslavadamente.

(Machado de Assis)

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Um modo de andar


Não é à toa que entendo os que buscam caminho. Como busquei arduamente o meu!
E como hoje busco com sofreguidão e aspereza o meu melhor modo de ser, o meu atalho, já que não ouso mais falar em caminho. Eu que tinha querido. O caminho, com letra maiúscula, hoje me agarro ferozmente à procura de um modo de andar, de um passo certo. Mas o atalho com sombras refrescantes e reflexo de luz entre as árvores, o atalho onde eu seja finalmente eu, isso que não encontrei. Mas sei de uma coisa: meu caminho não sou eu, é outro, é os outros. Quando eu puder sentir plenamente o outro estarei salva e pensarei: eis o meu porto de chegada.

(Clarice Lispector)

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Hipocritamente imortais



Somos todos imortais. Teoricamente imortais, claro. Hipocritamente imortais. Porque nunca consideramos a morte como uma possibilidade cotidiana, feito perder a hora no trabalho ou cortar-se fazendo a barba, por exemplo. Na nossa cabeça, a morte não acontece como pode acontecer de eu discar um número telefônico e, ao invés de alguém atender, dar sinal de ocupado. A morte, fantasticamente, deveria ser precedida de certo 'clima', certa 'preparação'. Certa 'grandeza'. Deve ser por isso que fico (ficamos todos, acho) tão abalado quando, sem nenhuma preparação, ela acontece de repente. E então o espanto e o desamparo, a incompreensão também, invadem a suposta ordem inabalável do arrumado (e por isso mesmo 'eterno') cotidiano. A morte de alguém conhecido e/ou amado estupra essa precária arrumação, essa falsa eternidade. A morte e o amor. Porque o amor, como a morte, também existe - e da mesma forma, dissimulada. Por trás, inaparente. Mas tão poderoso que, da mesma forma que a morte - pois o amor também é uma espécie de morte (a morte da solidão, a morte do ego trancado, indivisível, furiosa e egoisticamente incomunicável) - nos desarma. O acontecer do amor e da morte desmascaram nossa patética fragilidade.
(Caio Fernando de Abreu)

terça-feira, 17 de novembro de 2009



Também eu saio à revelia
e procuro uma síntese nas demoras
cato obsessões com fria têmpera e digo
do coração: não soube e digo
da palavra: não digo (não posso ainda acreditar
na vida) e demito o verso como quem acena
e vivo como quem despede a raiva de ter visto

(Ana Cristina César)

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Lembranças, recordações e renovadas lutas




O valor das coisas não está no tempo que elas duram,
mas na intensidade com que acontecem.
Por isso, existem momentos inesquecíveis,
coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.

(Fernando Pessoa )

Saudades



O que importa na vida é estar junto de quem se gosta.
Isso é a maior verdade do mundo...

(Clarice Lispector)

domingo, 15 de novembro de 2009





Nada fica de nada. Nada somos.
Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos
Da irrespirável treva que nos pese
Da humilde terra imposta,
Cadáveres adiados que procriam.

Leis feitas, estátuas vistas, odes findas —
tem cova sua. Se nós, carnes
A que um íntimo sol dá sangue, temos
Poente, por que não elas?
Somos contos contando contos, nada.

(Fernando Pessoa)

sábado, 14 de novembro de 2009



Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar…
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).

Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura…
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.

(Miguel Torga)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009




Viajante do mar cavalgando ventos,
deixando um rasto de pássaros entre as nuvens.

(Li Bai)

terça-feira, 10 de novembro de 2009

As repressarias da vida



O marinheiro encontrou o seu caminho no mar.
Mas uma noite, de repente,
o mar foi vazando, vazando,
até que secou completamente.

Seu barco, solitário
sobre o fundo do abismo,
torna-se uma coisa grotesca e sem sentido.

Estrangeiro entre os homens da terra,
caminha o marinheiro por estradas inúteis,
levando nos olhos um mistério verde
e na boca o amargor de tanto sal.

Contudo, nas noites de muito vento,
debruça-se na murada do tempo
e, enquanto espera o retorno do mar,
inaugura caminhos de cinza e de nada.

(Thiago de Mello)

domingo, 8 de novembro de 2009

A asa arde ...



Voar com a asa ferida?
Abram alas quando eu falo.
Que mais foi que fiz na vida?
Fiz, pequeno,
quando o tempo
estava todo ao meu lado
e o que se chama passado, passatempo, pesadelo,
só me existia nos livros.
Fiz, depois, dono de mim,
quando tive que escolher entre um abismo,
o começo,
e essa história sem fim.
Asa ferida, asa ferida,
meu espaço, meu herói.
A asa arde.
Voar, isso não dói.

(Paulo Leminski)

sábado, 7 de novembro de 2009

Solidão

Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos
e procuramos em vão pela nossa alma.

(Chico Buarque)

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Brevidades


No breve número de doze meses
O ano passa, e breves são os anos,
Poucos a vida dura.
Que são doze ou sessenta na floresta
Dos números, e quanto pouco falta
Para o fim do futuro!
Dois terços já, tão rápido, do curso
Que me é imposto correr descendo, passo.
Apresso, e breve acabo.
Dado em declive deixo, e invito apresso
O moribundo passo.

(Fernando Pessoa)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009


Para vermos o azul olhamos o céu.
A terra é azul para quem olha do céu.
Azul será uma cor em si ou uma questão de distância?
Ou uma questão de grande nostalgia?
O inalcançável é sempre azul...

(Clarice Lispector)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Existir




Renego tudo.
Renego mais do que tudo.
Renego a gládio e fim todos os Deuses e a negação deles.
Mas o que é que me falta, que o sinto faltar-me no estômago e na
circulação do sangue?
Que atordoamento vazio me esfalfa no cérebro?
Devo tomar qualquer coisa ou suicidar-me?
Não: vou existir. Arre! Vou existir.
E-xis-tir...
E--xis--tir ...

(Fernando Pessoa)

terça-feira, 3 de novembro de 2009





Adoecer de nós a Natureza:
- Botar aflição nas pedras
[Como fez Rodin].

(Manoel de Barros)

domingo, 1 de novembro de 2009

Verde



Que bom não ser
Estando acordado!
Também em mim enverdecer
Em folhas dado!

(Fernando Pessoa)