terça-feira, 28 de setembro de 2010

Só viver, não é?

Tudo isso dói.
Mas eu sei que passa que se está sendo assim é porque deve ser assim, e virá outro ciclo, depois.
Para me dar força, escrevi no espelho do meu quarto: “Ta certo que o sonho acabou, mas também não precisa virar pesadelo, não é?” É o que estou tentando vivenciar.
Certo, muitas ilusões dançaram - mas eu me recuso a descrer absolutamente de tudo, eu faço força para manter algumas esperanças acesas, como velas. Também não quero dramatizar e fazer dos problemas reais monstros insolúveis, becos-sem-saída.
Nada é muito terrível.viver,não é?
A barra mesmo é ter que estar vivo e ter que desdobrar, batalhar um jeito qualquer de ficar numa boa. O meu tem sido olhar pra dentro, devagar, ter muito cuidado com cada palavra, com cada movimento, com cada coisa que me ligue ao de fora. Até que os dois ritmos naturalmente se encaixem outra vez e passem a fluir.
Porque não estou fluindo.

(Caio Fernando de Abreu)

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Salve a cultura!

Salve a Casa do Caio Fernando Abreu

pela memória do escritor gaúcho!

Em Porto Alegre, um movimento liderado por Andréa Beheregaray - peleia - pela preservação da casa onde morou o escritor Caio Fernando Abreu no bairro Menino Deus. Seja um@ apoiador@ para transformar a casa num centro de cultura do acervo do escritor.

Entre na página http://www.peticao.com.pt/caio-fernando-abreu e assine a petição.



Distribuo em doses certas
esta dor que me atravessa...

(Marize Castro)

sábado, 25 de setembro de 2010

Que é sem fim...

Olhando meu navio
O impaciente capataz
Grita da ribanceira
Que navega pra trás
No convés, eu vou sombrio
Cabeleira de rapaz
Pela água do rio
Que é sem fim
E é nunca mais

(Dominguinhos - Chico Buarque)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010



Perdi-me no entrelaçar-se de malhas.
Entreguei-me no manchar-se de sonhos.
Marquei-me no soluçar-se de perdas.
Sob o peso deste som
um flautim
Sob o som deste peso
uma queda
rachou
a chave
calou
a chuva
barrou
a chama
(chuvisca no centro meu – nenhum grito)

(Ana Cristina César)

domingo, 19 de setembro de 2010

Escutando o mar...


Depois que descobri
que as palavras enviadas pelo vento
tem mais força...
Guardo todas...

(Caio Fernando de Abreu)

sábado, 18 de setembro de 2010

Por certo...

"Quanto mais ando, querendo pessoas, parece que entro mais no sozinho do vago..." - foi o que pensei na ocasião. De pensar assim me desvalendo. Eu tinha culpa de tudo, na minha vida, e não sabia como não ter. Apertou em mim aquela tristeza, da pior de todas, que é a sem razão de motivo; que, quando notei que estava com dor-de-cabeça, e achei que por certo a tristeza vinha era daquilo, isso até me serviu de bom consolo. E eu nem sabia mais o montante que queria, nem aonde eu extenso ia."

(João Guimarães Rosa)

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Último poema



Assim eu quereria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos

(Manoel Bandeira)

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Ontem choveu no futuro


Ontem choveu no futuro.
Águas molharam meus pejos
Meus apetrechos de dormir
Meu vasilhame de comer.
Vogo no alto da enchente à imagem de uma rolha.
Minha canoa é leve como um selo.
Estas águas não têm lado de lá.
Daqui só enxergo a fronteira do céu.
(Um urubu fez precisão em mim?)
Estou anivelado com a copa das árvores.
Pacus comem frutas de carandá nos cachos.

(Manoel de Barros)

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Se eu...



Se eu me sentir sono,
E quiser dormir,
Naquele abandono
Que é o não sentir,
Quero que aconteça
Quando eu estiver
Pousando a cabeça,
Não num chão qualquer,
Mas onde sob ramos
Uma árvore faz
A sombra em que bebamos,
A sombra da paz.
(Fernando Pessoa)

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

De cada dia

De cada dia arrancar das coisas, com as unhas, uma modesta alegria;

em cada noite descobrir um motivo razoável para acordar amanhã.

(Caio Fernando Abreu)

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Continuar...

Substituímos expressões fatais como “não resistirei”

por outras mais mansas,

como “sei que vai passar”.

Esse é o nosso jeito de continuar.

(Caio Fernando Abreu)