segunda-feira, 26 de março de 2012

Labirinto

Este é o labirinto de Creta. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro, que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações como Maria Kodama e eu nos perdemos. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro, que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações como Maria Kodama e eu nos perdemos naquela manhã e continuamos perdidos no tempo, esse outro labirinto.

(Jorge Luis Borges)

domingo, 18 de março de 2012

É preciso pensar...

Ando pelos subterrâneos
Como subterfúgio
Num continuum
Evito dores das luzes
Ando pelos ares
Como os pássaros
Encondo asas
Para não as cortarem
Às vezes ando
Como semiviva
Por lembrar a vida à morte
E não quero pensar nisso

(Rosália Milsztajn)

domingo, 4 de março de 2012

Perder é uma arte...


Uma arte

A arte de perder não tarda aprender;
tantas coisas parecem feitas com o molde da perda
que o perdê-las não traz desastre.
Perca algo a cada dia.
Aceita o susto de perder chaves, e a hora passada embalde.
A arte de perder não tarda aprender.
Pratica perder mais rápido mil coisas mais:
lugares, nomes, onde pensaste de férias ir.
Nenhuma perda trará desastre.
Perdi o relógio de minha mãe.
A última, ou a penúltima, de minhas casas queridas foi-se.
Não tarda aprender, a arte de perder.
Perdi duas cidades, eram deliciosas.
E, pior, alguns reinos que tive, dois rios, um continente.
Sinto sua falta, nenhum desastre.
- Mesmo perder-te a ti (a voz que ria, um enteamado),
mentir não posso.
É evidente: a arte de perder muito não tarda aprender,
embora a perda - escreva tudo! - lembre desastre.

(Elizabeth Bishop)