sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Acontece assim: tiro as pernas do balcão de onde

via um sol de inverno se pondo no Tejo e saio de

fininho dolorosamente dobradas as costas e

segurando o queixo e a boca com uma das mãos.

Sacudo a cabeça e o tronco incontrolavelmente,

mas de maneira curta, curta, entendem? Eu

estava dando gargalhadas e agora estou

sofrendo nosso próximo falecimento, minhas

gargalhadinhas evoluíram para um sofrimento

meio nojento, meio ocasional, sinto uma dó

extrema do rato que se fere no porão, ai que

outra dor súbita, ai que estranheza e que lusitano

torpor me atira de braços abertos sobre as ripas

do cais ou do palco ou do quartinho. Quisera

dividir o corpo em heterônimos - medito aqui

no chão, imóvel tóxico do tempo.

(Ana Cristina César)

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