domingo, 4 de maio de 2008

Anaïs Nin - "Penso que se escreve para um mundo onde se possa viver"

Já faz certo tempo que estou querendo postar algo de Anaïs Nin. Escritora francesa, com uma vida nada tão diferente do cotidiano do século XXI – mas certamente menos hipócrita, mais ousada e verdadeira! Estes indícios podem ser observados pelo teor da carta que Anais Nin escreveu a um editor que comprava os contos eróticos que produzia com Henry Miller. Para compreender o que me refiro é interessante um passeio rápido pela biografia desta escritora:

“A escritora francesa Anaïs Nin nasceu em Neuilly, um subúrbio de Paris, em 1903. Teve uma infância verdadeiramente cosmopolita, passando por várias cidades da Europa. Porém, quando Anaïs tinha onze anos, seu pai - o pianista espanhol Joaquin Nin - abandonou a família e foi para a América. Foi o ponto de partida para que a pequena Anais começasse a escrever seus diários, inicialmente uma longa carta dirigida ao pai. Nesse mesmo ano, sua mãe, a franco-dinamarquesa Rosa Culmell, levou Anaïs e seus outros dois filhos para Nova Iorque.
Autodidata, a escritora passou a infância lendo e mantendo um pequeno jornal, que ela inicialmente escreveu em francês e o qual só começou a redigir em inglês a partir dos seus dezessete anos. Em NY, a escritora estudou arte até que, em 1923, casou-se com HughGuiler. Guiler ilustrou mais tarde os livros da esposa, sob opseudônimo de Ian Hugo. O casal mudou-se para Paris quando Anaïscomeçou a escrever seus livros de ficção, nos anos 30.
Na França, a escritora consolidou-se na profissão a partir dolançamento da obra "D.H. Lawrence: na unprofessional study". Seguiu-sea este uma infinidade de livros, como por exemplo o consagrado "A Casado Incesto" (The House of Incest), um poema em prosa que mostra umasérie de tormentos psicológicos, bem ao gosto da literaturaatormentada de Anaïs.
Toda a sua literatura tem uma forte conotação erótica, mais mostrada explicitamente nos volumes "Delta de Vênus" (disponível em filme) e"Little Birds". Com Hugh Guiler, a escritora viveu um casamento demais de 50 anos. Apesar de feliz, Anaïs manteve uma série deenvolvimentos extraconjugais, com nomes como Henry Miller, Otto Rank,Gore Vidal, Edmund Wilson.
Teve uma vida amorosa cheia de viesses, e foi capaz de manter umsegundo marido, Rupert Cole, por pelo menos 25 anos, constituindo umarelação de bigamia, já que nunca se separou de Hugh Guiler. Os diáriosde Anaïs Nin cobrem o período de 1931 a 1977, e trazem uma visão daescritora como mulher e artista. Mais do que retratos biográficos, osdiários compõem uma verdadeira obra de arte, tamanha a riqueza dedetalhes e a maneira como a escritora pensou em construir seusescritos.
Anaïs voltou à Nova Iorque um pouco antes da eclosão da Segunda GrandeGuerra. Começou, então, a dividir sua vida no eixo Nova Iorque-LosAngeles, o que significava, também, estar entre Hugo, seu primeiromarido, e Rupert, o marido/amante. A escritora ficou mais conhecidapelos seus diários, mas não dá para menosprezar a grande quantidade denovelas e poemas em prosa, em estilo surrealista, que produzia semcessar, com grande sensibilidade e percepção. Em 1974, a escritora foieleita para o National Institute of Arts and Letters, nos Eua. Em1977, na cidade de Los Angeles, o câncer colocava fim à sua vida.”
A carta:
Querido Colecionador.
Nós o odiamos! O sexo perde todo o seu poder e seu vigor quando éexplícito, exagerado, quando é uma obsessão mecânica. Transforma-se emtédio. O senhor nos ensinou melhor do que ninguém, o erro de nãomisturar sexo com emoções, apetites,desejos, luxúria, fantasias,caprichos, vínculos pessoais, relações profundas que mudam sua cor,sabor, ritmo, intensidade.
Não sabe o que está perdendo com sua observação microscópica da atividade sexual, excluindo os aspectos que são seu combustível: intelectuais, imaginativos, românticos, emocionais.
Isto é o que dá ao sexo sua surpreendente textura, suas transformações sutis, seus elementos afrodisíacos. O senhor reduz seu mundo de sensações, o faz murchar, mata-o de fome, dessangra-o.
Se nutrisse sua vida sexual com toda a excitação que o amor injeta na sua sensualidade, seria o homem mais potente do mundo. A fonte da potência sexual é a curiosidade, a paixão.
O senhor está vendo sua chaminha extinguir-se asfixiada. A monotonia é fatal para o sexo. Sem sentimentos, inventividade, disposição, não há surpresas na cama.
O sexo deve ser misturado com lágrimas, riso, palavras, promessas,cenas, ciúmes, invejas, todos os componentes do medo, viagens ao exterior, novos rostos, romances, histórias, sonhos, fantasias, música, dança, ópio, vinho.
Sabe quanto o senhor está perdendo por ter esse periscópio na ponta do seu sexo, quando poderia gozar um harém de maravilhas diferentes e novas? Não existem dois cabelos iguais, mas o senhor não nos permite perder palavras na descrição do cabelo; tampouco dois cheiros, mas se nos expandimos o senhor berra: "Deixem a poesia de lado!". Não existem duas peles com a mesma textura e jamais a luz, a temperatura ou assombras são as mesmas, nunca os mesmos gestos, pois um amante quando está excitado pelo amor verdadeiro, pode percorrer a gama de séculos de ciência amorosa.
Que variedade, que mudanças de idade, que variações na maturidade e na inocência na perversão e na arte!...
Temos nos sentado durante horas nos perguntando como é o senhor. Se tem negado ao seus sentidos seda, luz, cor, cheiro, caráter, temperamento, agora deve estar completamente murcho. Há tantos sentidos menores fluindo como afluentes do rio do sexo, nutrindo-o. Só a pulsação unânime do coração e do sexo podem criar o êxtase.

Nenhum comentário: