segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Caio Fernando de Abreu numa noite de domingo ...


Era isso — aquela outra vida,
inesperadamente misturada à minha,
olhando a minha opaca vida
com os mesmos olhos atentos
com que eu a olhava: uma pequena epifania.
Em seguida vieram o tempo,
a distância,
a poeira soprando.
Mas eu trouxe de lá a memória
de qualquer coisa macia
que tem me alimentado nestes dias
seguintes de ausência e fome.
Sobretudo à noite, aos domingos.
Recuperei um jeito de fumar
olhando para trás das janelas,
vendo o que ninguém veria.

"Só quero ir indo junto com as coisas,

ir sendo junto com elas,

ao mesmo tempo,

até um lugar que não sei onde fica,

e que você até pode chamar de morte,

mas eu chamo apenas de porto."

Um comentário:

Anônimo disse...

Viver agora, tarefa dura. De cada dia arrancar das coisas, com as unhas, uma modesta alegria; em cada noite descobrir um motivo razoável para acordar amanhã. Mas o poço não tem fundo, persiste sempre por trás, as cobras no fundo enleadas na lança.